Uma queixa recorrente em boxes de Crossfit é a reclamação de vizinhos devido ao excesso de ruído aéreo e vibração, ou simplificadamente, o barulho.
Jonathas Oliveira
Blog
O que ouvimos no Crossfit?
O ruído aéreo pode ser caracterizado como as ondas sonoras do ambiente: a música, a voz de comando do Coach ou o ruído da anilha ao tocar o chão. Já a vibração, é principalmente percebida pelo impacto da barra com anilhas no chão em movimentos que, eventualmente, há a queda livre de pesos mais pesados como no Levantamento Terra, Power Clean ou Snatch. Exercícios nas cordas navais como Cycle/ Alternating Waves também geram vibrações no piso, no entanto, como possuem pouca massa, podem ser amenizadas com soluções convencionais como o piso elevado e superfície emborrachada.
O foco deste artigo é debater o que está em jogo quando se trata de ruído aéreo no Crossfit.
Antes de iniciar a nossa conversa sobre o ruído aéreo e vibração nos boxes de Crossfit, podemos afirmar que há um consenso geral da população de que o ruído incomoda e é maléfico para a saúde, e adiantamos que sim, diversos estudos apontam que, por exemplo, o ruído de impacto — caracterizado pela alta intensidade e curto período de duração — pode causar alterações hormonais no corpo e resultar no aumento do estresse e risco cardiovascular [1].
Além disso, também há uma outra crença: que o estímulo com uma música alta ou voz de comando num alto volume do Coach pode culminar na alta performance do atleta.
O que dizem as pesquisas
A verdade é que não existe um consenso no uso destes mecanismos para alcançar uma maior performance do atleta. Por exemplo, Brupbacher et al. (2014)[2] conduziram um estudo para investigar se a música poderia produzir efeitos ergogênicos no contexto do Crossfit. Apesar da pequena amostragem — 13 atletas com capacidades físicas semelhantes –, eles verificaram que a música, neste caso, piorou a performance dos atletas, atuando como um fator de distração. Analogamente, Atan (2013)[3] concluiu que a utilização de música durante o treino de exercícios anaeróbicos também não influenciou positivamente a performance dos atletas.
Porém, Karageorghis et al. (2009)[4] apresentam uma pesquisa em que a utilização da música teve um efeito ergogênico para exercícios de endurance. Analogamente, Nakamura et al. (2010)[5] mostraram que durante o exercício de bicicleta de alta intensidade, os participantes do experimento tiveram uma performance superior quando escutavam a música preferida em comparação a uma outra música qualquer e, inclusive, reportaram uma percepção de maior desconforto no segundo caso.
Portanto, apesar de ser um assunto onde não há uma verdade absoluta, é inegável que, considerando ou não os aspectos de performance, há o fator subjetivo de entretenimento que a utilização da música proporciona na prática do exercício físico. No caso do Crossfit, é indiscutível que o estímulo pela audição proporciona uma atmosfera mais harmoniosa entre os alunos, os quais desenvolvem um senso de pertencimento ao time no longo prazo.
Música para um, ruído para o outro
O problema é que: a música para um pode ser o ruído para o outro (por exemplo, o vizinho), e isso pode afetar a performance de quem possui um box de Crossfit, pois ao mesmo tempo que a música atua como um fator positivo para os alunos, pode também fechar o estabelecimento por infringir a legislação.
Resumidamente, a norma regulamentadora atualizada é a NBR 10151 (2019)[6] que apresenta os procedimentos técnicos de medição e avaliação de níveis de pressão sonora em áreas habitadas. A Tabela 1, a seguir, mostra os limites de níveis de pressão sonora considerados adequados de acordo com o tipo de área habitada. Existem particularidades e correções quanto à medição que devem ser consideradas pelo profissional competente, no entanto, de maneira geral, pode-se assumir estes valores da tabela como referência para quaisquer experimentações informais.
Naturalmente, no período noturno (entre 22:00 e 7:00) a tolerância é menor por se tratar do período de descanso de boa parte da população.
Descubra o desempenho sonoro do seu Box
Portanto, por mais óbvia que seja, uma dica para resolver o problema de ruído aéreo sem mexer no bolso é: diminuir o volume das caixas de som. Mas, diminuir até que ponto?
Vou explicar com um exemplo simples: imagine que o seu box de Crossfit esteja localizado em uma “área mista predominantemente residencial” e esteja 100% enclausurado, isto é, não existem frestas ou janelas abertas onde o som possa passar para o ambiente externo. Considere também que ele é totalmente construído em concreto de espessura 5 cm. Meça com o aplicativo Decibel Sound Meter Pro* (grátis para iOS e Android) a uma distância de 1 metro da caixa de som e a mantenha no máximo em 93 dB e anote o volume indicado pelo seu equipamento de som. Desta forma, como sua parede de concreto de 5 cm isola 38 dB, você acaba de descobrir o volume máximo que o seu equipamento de som pode operar, pois (93–38) = 55 dB irão vazar para o ambiente externo, mantendo o seu estabelecimento no limite da norma no período diurno. Esta é a ideia.
Porém, como o seu Crossfit possui janelas, portas e paredes de diferentes espessuras e materiais, na prática, é interessante fazer o teste com duas pessoas e dois celulares: a primeira medindo a 1 metro da caixa e a outra no ambiente exterior, há 1 metro da fachada. A pessoa ao lado da caixa de som deve aumentar ou diminuir o volume conforme orientação da pessoa do lado de fora, que está medindo o ruído vazado. Este, não deve passar do limite da legislação, no caso exemplificado, 55 dB no período diurno e 50 dB no período noturno.
Portanto, ao final desta experimentação, será descoberto qual o volume máximo que você pode utilizar no seu equipamento de som. Logicamente, quanto melhor for o isolamento acústico do seu box de Crossfit, maior liberdade você terá para intensificar o volume na sua caixa de som de acordo com os exercícios e/ou aulas ministradas.
No próximo artigo, falaremos sobre os exercícios do Crossfit críticos quando se fala em vibração, e quais soluções existem hoje no mercado para amenizá-la.
* A medição com o aplicativo Decibel Sound Meter Pro não substitui o equipamento adequado para medição de nível de pressão sonora (Sonômetro), mas pode ser considerado para testes informais.
REFERÊNCIAS
[1] Babisch, W., 2003. Stress hormones in the research on cardiovascular effects of noise. Noise and Health, 5(18).
[2] Brupbacher, G., Harder, J., Faude, O., Zahner, L. and Donath, L., 2014. Music in CrossFit® — influence on performance, physiological, and psychological parameters. Sports, 2(1), pp.14–23.
[3] Atan, T., 2013. Effect of music on anaerobic exercise performance. Biology of Sport, 30(1), p.35.
[4] Karageorghis, C.I., Mouzourides, D.A., Priest, D.L., Sasso, T.A., Morrish, D.J. and Walley, C.L., 2009. Psychophysical and ergogenic effects of synchronous music during treadmill walking. Journal of Sport and Exercise Psychology, 31(1), pp.18–36.
[5] Nakamura, P.M., Pereira, G., Papini, C.B., Nakamura, F.Y. and Kokubun, E., 2010. Effects of preferred and nonpreferred music on continuous cycling exercise performance. Perceptual and Motor Skills, 110(1), pp.257–264.
[6] https://www.abntcatalogo.com.br/norma.aspx?ID=416711